A desconexão de grande parte do empreendedorismo e do tecido empresarial, tanto privado como público, dos impactos das suas atividades em contraste com o real benefício que trazem à sociedade é grosseiramente ignorada e frequentemente descontextualizada. Isto torna-se ainda mais evidente quando internalizamos os custos sociais e ambientais de determinados setores da sociedade.
A perceção pública é fortemente influenciada pelo mantra do crescimento económico como a única métrica possível de desenvolvimento. Esta assunção resulta, por exemplo, da ideia subjacente ao chavão inicial, que procura projetar os EUA como uma potência económica apenas devido à sua fraca regulamentação estatal.
Curiosamente, o milagre económico chinês resultou exatamente do oposto. E, apesar de não ser de todo apologista do modelo económico e político da China, é inegável que o desenvolvimento exponencial do país não esteve ligado a uma menor regulamentação.
Se analisarmos os dados de 2024, podemos verificar que, em termos de Produto Interno Bruto (PIB) ajustado pela Paridade do Poder de Compra — ou seja, considerando os custos de vida — a China ocupa o primeiro lugar (37,1 “triliões” de dólares), seguida dos EUA (29,2 t), da Índia (16 t), da Federação Russa (6,9 t) e do Japão (6,6 t), sendo que o primeiro país europeu do ranking é a Alemanha, na 6.ª posição (6 t).
No entanto, se considerarmos o PIB per capita, isto é, a riqueza dividida pelo número de habitantes, o ranking altera-se significativamente. Em primeiro lugar surge o Luxemburgo (151.146 dólares), seguido da Irlanda (103.446$), Noruega (83.454$), Suíça (81.495$), Dinamarca (80.305$), Singapura (78.808$) e, só depois, os EUA (73.222$).
Se, por outro lado, internalizarmos os custos ambientais, o investimento na preservação dos ecossistemas e a descarbonização dos setores produtivos, verificamos, de acordo com a ONU e o Environmental Performance Index 2024, que os 22 primeiros países são europeus. O primeiro país extra-europeu a surgir na lista é a Austrália, em 23.º lugar, sendo que os EUA ocupam a 35.ª posição e a China a 156.ª, num total de 180 países. Ah, Portugal ocupa a 26ª posição.
À luz destes dados, poder-se-ia presumir que a Europa vive atrasada ou em subdesenvolvimento, mas a realidade demonstra o oposto. As regulações europeias e dos Estados-Membros, os investimentos a longo prazo na estabilização do clima e a legislação baseada em múltiplos fatores científicos e sociais posicionam o continente como um polo empresarial de longo prazo. Mais que um custo é investimento.
Sabemos que a pressão para que cada nação seja “a primeira”, num mundo onde as relações internacionais estão em rápido declínio, leva à perceção de que apenas crescendo ad eternum conseguiremos suprir as nossas necessidades.
Isto segue a linha do mantra liberal da Curva Ambiental de Kuznets, que sugere que os ecossistemas são uma externalidade necessária para alcançar o “desenvolvimento”. Contudo, todas as nações enfrentam o mesmo problema: a transposição dos limites das barreiras ecológicas planetárias.
Perante isto, é fundamental destacar que o tecido empresarial, juntamente com uma regulação equilibrada a nível internacional, regional e nacional — resistente à tentação opressiva de Estados totalitários, e sempre orientada por decisões científicas, multissetoriais e fundamentadas em princípios jurídicos — deve internalizar os custos de um verdadeiro modelo de desenvolvimento.
Neste domínio, e apesar de ainda existirem muitos desafios a superar, especialmente considerando os retrocessos políticos e regulatórios dos últimos anos, a Europa continua a liderar.
Ao contrário dos chavões, muitas vezes disseminados por memes e alimentados por algoritmos, devemos persistir na luta contra esses ímpetos populistas, anticientíficos e extremistas, particularmente daqueles que acreditam piamente que o mercado resolve tudo ou que a ciência ecológica é apenas um conceito “woke”.